domingo, 20 de novembro de 2016

O Fadista

Viveu em Lisboa um dia
(Amigo valente da farra)
Certo fadista altaneiro
Com a sua guitarra.

De cabelo solto ao vento
Passeia altivo na rua
E com passo decidido
Pensa que a cidade é sua.

Um pouco por toda a cidade
Que o largo Tejo abençoa
O fadista e a guitarra
Cantam as ruas de Lisboa.

Mas uma manhã de Maio
Quando à janela cantava
Viu uma dama singela
Que à sua porta passava.

Ai, que boca tão vermelha
Ai, os cabelos que tem
Mais seus olhos cor do mar
Que não olham para ninguém!

O xaile que leva aos ombros
Recorda a vida que viveu;
A canastra vai vazia
Hoje nada o mar lhe deu.

Pela noite ou pelo dia
À sua porta passava
E o fadista enamorado
Com a guitarra, cantava.


Mas eis que certo dia
Pela porta não passou
Disse-lhe a maresia:
"Foi o Tejo que a levou".

O fadista, amarga sorte,
Pronto foi a enterrar
E deu lugar ao silêncio
Quando morreu a cantar.

Na varanda do seu quarto
Ficou só, ao abandono,
A sua velha guitarra
Partida, sem cordas, sem dono.

Mas se o corpo é efémero
No fim fica o sentimento
E o fadista morreu
                                                                                    Em profundo desalento.

E ainda hoje o povo conta
(Mas baixinho, de soslaio)
Que pelas manhãs de Maio
À hora que o Sol desponta
O fadista, em lealdade
E não livre da amargura
Já no pó da sepultura
Chora canções de Saudade...


Sem comentários:

Enviar um comentário