domingo, 6 de agosto de 2017

Apoteose do Poeta II



Foi pelo anoitecer que um murmúrio se ouviu:
"Numa pedra dura e fria o poeta sonha!"

O poeta nada em estrelas cor de prata
Pelo vácuo escuro dos sonhos
E uma maior, dourada e em chamas
Rasga os céus da cor vermelha viva
Pelo vácuo escuro dos sonhos
Lá, no mar de estrelas cor de prata...




Rasga-se o horizonte; o poeta em calma
Separa o céu e a terra, as nuvens e o mar
Não se ovem rios, grilos a cantar
Só nas profundezas da sua alma.
E o poeta olha um céu de árvores e flores
De areias e tempos, verdes e negros.
E o poeta olha um mar de estrelas e nuvens
Baixa-se e, com as suas mãos, colhe uma flor-estrela
Um pedaço de céu, um pedaço de mar
Um pedaço de fora, um pedaço de si...

Numa estrela que brilha o poeta sentou-se
E, no horizonte branco, emerge uma luz
Tão ou mais clara que a prata
Ou mais quente que o fogo.
O poeta fecha os olhos, a luz é forte
Ventos arrastam-no, o poeta escorrega
E a pobre alma, de nascimento sem sorte
A uma parede de gelo, em vão, se apega
Desce por um buraco sem fundo, o desgraçado
E a luz, cada vez mais longe, quase se some
E a escuridão vencedora aos poucos consome
O seu corpo que ficou, de lutar, cansado
E nesse cair, nesse purgatório, no abismo
Uma voz sobe desse poço sem fundo:
"Tenho-te guardado para meus furores
E neste punir aos Homens ensino
Este meu castigo, que é o destino
Dos que desvendam os segredos do Mundo!..."

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