(Amigo valente da farra)
Certo fadista altaneiro
Com a sua guitarra.
De cabelo solto ao vento
Passeia altivo na rua
E com passo decidido
Pensa que a cidade é sua.
Um pouco por toda a cidade
Que o largo Tejo abençoa
O fadista e a guitarra
Cantam as ruas de Lisboa.
Mas uma manhã de Maio
Quando à janela cantava
Viu uma dama singela
Que à sua porta passava.
Ai, que boca tão vermelha
Ai, os cabelos que tem
Mais seus olhos cor do mar
Que não olham para ninguém!
O xaile que leva aos ombros
Recorda a vida que viveu;
A canastra vai vazia
Hoje nada o mar lhe deu.
Pela noite ou pelo dia
À sua porta passava
E o fadista enamorado
Com a guitarra, cantava.
Mas eis que certo dia
Pela porta não passou
Disse-lhe a maresia:
"Foi o Tejo que a levou".
O fadista, amarga sorte,
Pronto foi a enterrar
E deu lugar ao silêncio
Quando morreu a cantar.
Na varanda do seu quarto
Ficou só, ao abandono,
A sua velha guitarra
Partida, sem cordas, sem dono.
Mas se o corpo é efémero
No fim fica o sentimento
E o fadista morreu
Em profundo desalento.
E ainda hoje o povo conta
(Mas baixinho, de soslaio)
Que pelas manhãs de Maio
À hora que o Sol desponta
O fadista, em lealdade
E não livre da amargura
Já no pó da sepultura
Chora canções de Saudade...
Sem comentários:
Enviar um comentário